Foi-me dito que sonhar muda o mundo. Todavia, aparentemente, ninguém teve a decência prévia de explicar o porquê da afirmação. Se antes confiávamos que a origem da frase residia no sentido de que a vida, em sua forma mais positiva, é o agente transformador. Hoje, na famigerada casa dos 20, consigo perceber que é uma origem camuflada.
Simples porque: ninguém queria explicar o porre que seria. Talvez para desviar de ansiedade e desânimo em relação ao futuro, ou então evitar grandes explicações sobre as implicações contínuas da vida adulta. De qualquer forma, muitos foram aqueles que palpitaram sobre o nosso futuro e pouquíssimos aqueles que minimamente nos prepararam.
E no futuro chegamos. E honestamente? Aqui tá todo mundo cansado. Ninguém sabe para onde ir ou quem ser. Perdemos inúmeras e substanciais coisas no meio do percurso e hoje estamos com dificuldade em lembrar que coisas eram.
Os sonhos passam a ser disfarçados por metas e objetivos e agora são medidos em rendimento, assim como a nossa vida. Desejávamos certas profissões pela vontade de ser, agora precisamos delas para sobreviver, ou pior, para encontrar um objetivo único de vida. A loucura e o divertimento ficaram para trás, não só como memórias, mas agora também como aspectos proibidos da vida adulta séria, profissional e de sucesso.
Será que parte do processo é esquecer como era bom viver?
A conclusão esmagadora é de que a vida depois da infância entra em rendimento decrescente de sonhos.
Porque no meio desse caminho torto, cansativo e exaustivo nos disseram que os sonhos de nada valiam e o conselho inicial foi ignorado. Uma parte de nós foi esmagada e substituída por uma angústia constante que não sabemos explicar ou combater. Infelizmente, aos 18, nenhum de nós recebeu o manual de sobrevivência de que estamos precisando.
O futuro e suas maravilhas. Duas opções: ou o futuro que esperávamos ainda não chegou ou fomos enganados com um bilhete falso pro País das Maravilhas. Uma pena que não haja um tribunal disposto a julgar um processo de retratação nesse caso. A Corte dos Frustrados e Ludibriados deve ser exclusividade do País das Maravilhas.
Podemos não conseguir uma auditoria, mas ninguém nos impede de criar uma; a vida adulta tem certas regalias. O ciclo de constantes angústias pode ser rompido com um pouco de empenho e um pouco de delírio. Deixamos a imaginação em escanteio por muito tempo, está na hora do comeback.
Viver a própria Utopia para conseguir sobreviver fora dela. Imaginar a mudança para poder ver alguma esperança. Quando somos alimentados por sonhos e utopias não sobrevivemos mais, voltamos a existir e a viver.
Isso não significa que iremos sempre acertar nos sonhos. Entretanto, enquanto expressarem emoção, sentimento e razão estamos começando a alinhar o caminho.
Relaxa, bem. Não se preocupe. Uma hora a gente acerta.
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No último sábado (23/09/2023) durante a exibição do programa televisivo Altas Horas, liderado pelo querido Serginho Groisman, a banda de rock nacional Titãs contou com inúmeras homenagens. Entre elas, os antigos professores dos integrantes da banda foram prestigiá-los no programa. Emocionados pela ocasião, uma das presentes docentes em seu discurso fala sobre aqueles, na sociedade brasileira, que seriam ‘alimentados por sonhos e utopias’.
Inspirada pelo programa e especialmente por essa declaração, tomei a decisão de, humildemente, escrever o texto de hoje.
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Arte feita por Julia Santos Neves
Todos os elementos da colagem acima são devidamente creditados no post original no aplicativo Landing (basta clicar para acessá-lo).
Para o retorno do blog, nada mais justo e verdadeiro do que a publicação de mais um texto para a coluna ‘Reflexões & Devaneios’. Tendo em mente sonhos e utopias, permita que este escrito traga novos ares e novas perspectivas.
Virtuosamente,
Julia.