O que querem de nós, afinal?
Por muito tempo desejei um espaço em que a Liberdade pudesse ser usada em sua forma mais pura e autêntica. Gostaria de escrever e enxergar a escrita como um ato para testar os limites das ideias que tinha e um experimento para ver até onde poderiam chegar. Ver, inclusive, se a Imaginação e a Criatividade tinham limitações.
Não foi difícil perceber que certa hora o limite chegaria. Entretanto, o intragável da história está em como ele se deu.
Adoraria publicar o primeiro texto desta coluna sobre um assunto mais ameno e menos incisivo. Talvez – alguns diriam – menos polêmico; contudo, tenho a suposição de que tudo torna-se polêmico nas mãos de quem quer comprar briga.
A escrita também é um processo de autoconhecimento. Quão boa é sua ideia ao ponto de torná-la concreta usando uma certa escolha de palavras?
Escrevi em todos os momentos que pude ao longo desses (quase) 20 anos; todavia, meus textos mais sinceros em todos os aspectos de criação foram aqueles que entreguei aos meus amigos. De bilhetes à cartas, eram nesses momentos em que eu encontrava alguma paz de espírito.
Devo muito a todos eles. Porque, graças a episódios como esses, percebi que gostava de escrever pela liberdade que sentia e pela possibilidade de imaginar que alguém estaria interessado no que eu estava disposta a dizer.
Adoraria sempre oferecer palavras de conforto ou de certa substância para conseguir, ao menos, entreter de forma agradável quem dispusesse de parte do seu tempo para ler o que tenho a escrever. Entretanto, não são todas as situações que enquadram-se a este molde.
Talvez crescer e amadurecer também signifique que teremos que encontrar inspiração por conta própria. Para alguém que considera escrever uma ação prazerosa, começa a ficar claro que determinados assuntos ultrapassam a mera vontade e curiosidade; alguns deles precisam ser ditos – ou melhor – escritos.
Por essa razão, o escritor também deve mostrar traquejo com as palavras que ousa fazer usas – mesmo que por apenas um instante ou metade de um papel. Palavras carregam consigo significados únicos e precisos; escolher seu melhor arranjo com primor não é uma tarefa sistemática.
Nada é o que parece; as maravilhas estão nos detalhes. A relação do escritor com seu texto pode ser comparada com a existência de um caleidoscópio: novos arranjos podem ser criados a todo momento, tudo depende da perspectiva.
Rascunhos, com ajustes e alterações, tornam-se textos rebuscados. O potencial, de fato, só existe porque o núcleo da ideia conservou-se – ou seja, desde o início, já existia um rascunho rebuscado que buscava por um escritor para desenvolvê-lo.
Todavia, apesar das esplendorosas visões que essa motivação pode guiar, um específico tipo de público (se é que poderíamos chamar desta forma) flagela qualquer resquício de criatividade com uma busca incessante pela perfeição que alcança níveis utópicos. “Deslizes não são permitidos” – um mantra perverso que certas pessoas, pela constância e insistência, vencem pelo cansaço e, sorrateiramente, fazem os outros acreditarem em uma falácia como esta.
Há algo de errado, para dizer o mínimo. Começamos, pois, a desenrolar este devaneio.
Um fator disso tudo me incomoda a muito tempo. Os limites que antes esperava encontrar por contra própria foram, na realidade, criados, intitulados e moralizados de forma pífia por vias terceiras. Alguns, interessados em perseguir uma perfeição inexistente e exigi-la a qualquer custo; outros, ousam ultrapassar os parâmetros da decência e da moralidade ao criticar de forma desproporcional e inconcebível. O propósito deste grupo passa a ser atacar de forma agressiva, absurda, desproporcional, incoerente e execrável. O objetivo torna-se executar um julgamento sem que o réu tenha direito a defesa ou retalhação; além de constrangê-lo até a última instância.
Quão poucos são aqueles que se atém à palavra decência? Não acho sensato esperar – ou exigir – esta postura de alguém. Certas esperanças não precisam ser nutridas quando no fundo já sabemos que resultarão em decepções.
Um conselho? A raiva, o ódio, a agressão e os insultos proferidos por muitos, são os sinais de uma alma atormentada pela vida e pela própria realidade. Sendo assim, ignore-os. Eu mesma deveria aplicar esta fórmula mais vezes. Entretanto, creio que pode ser da Natureza Humana tentar buscar a compreensão, mesmo nos casos de estupidez.
O verbo criticar, neste ponto, é deturpado em grandes proporções. A ironia presente é que os próprios críticos não sabem o que é ou como sequer executar uma crítica.
Dirigir-se a “Todo mundo” é a mesma coisa que falar para o além. Se o discurso é genérico e, especialmente, generalista, desconfie. Genérico no sentido de dizer tudo e não chegar a lugar nenhum. Generalista, ao evocar todos e não citar ninguém. Em outras palavras, quando o conteúdo e o destinatário são imprecisos, desconfie.
Segundo esta escumalha há temas que eu não deveria escrever, falar ou argumentar sobre. Porque mesmo escolhendo o melhor arranjo de palavras, de qualquer maneira, alguém irá mal interpretá-las. Se as palavras não agradam, muito menos a escolha pelos assuntos. O que esperam de mim, afinal? O que esperam de todos nós? Gostaria de dizer que rebato a hostilidade de alguns com a minha indiferença. Porém, até mesmo esta, está reservada para outros assuntos. Sendo assim, me resta deixar claro a posição que assumo. Àqueles que de conteúdo nada entendem, vão se fuder. Não se assuste pela escolha de palavras, inclusive. Aqui, nada melhor e mais sonoro do que um bom palavrão empregado – expressa, justamente, a adequada tonalidade a ser usada.
Sugiro a estes sanguessugas de espírito e ânimo que escolham outro alguém para tirar o sossego já que de mim ganharam no máximo desprezo. Reservo-lhes um outro ambiente: o puro esquecimento. Seu lugar lá estará garantido sem nem ao menos necessitar de agendamentos prévios.
Refiro-me aqui a ninguém e a todo mundo (percebe a ironia?). Entendam estes como quiserem. Já sei que, provavelmente, neste ponto, algum deles já terá deturpado o que escrevi; então, de pouco importa (ou de pouco me interessa).
A hostilidade que aqui demonstro, caso ainda não tenha ficado clara, é puro e explícito sinal de autopreservação. Por que assumir esta postura? A probabilidade de consideração de eventos múltiplos e variadas repercussões está a meu favor. Em outras palavras, reportar-me sobre algo que ainda não ocorreu (mas já estava premeditado justamente por ser inevitável em um certo ponto) é mais estratégico do que esperar a ordem dos fatores.
Livro-me de qualquer entrave, restrição ou contenção que, involuntariamente, poderia estar comigo e aproveito a deixa para esclarecer o que mais for necessário. Assumo categoricamente: aqui, reivindico o espaço de livre-pensar. Deixaremos claro, explícito, acordado e categorizado:
que a Liberdade de pensar, ser e existir impere;
que a Intolerância não tenha lugar;
que os Direitos Humanos sejam referências e não objetos de ironia por quem jamais os compreendeu;
que a Ciência e a Educação sejam entendidas como pilares
e que a vida possa ser vivida com o máximo de Dignidade possível.
Resta-me ser, em todas as proporções, humilde. Afirmo peremptoriamente: não tenho respostas para nada, mas tenho perguntas para tudo. A humildade apresenta-se no ser ao assumir que não detemos toda verdade; a autenticidade vem da busca pela compreensão da mesma.
Neste ponto, ela apresenta-se ao lado do respeito – como dois conceitos intrínsecos, indissociáveis e aplicados de mão dupla.A partir do momento que haja transgressão de uma dessas ideias, não devo nada a ninguém que não esteja disposto a comportar-se de modo recíproco. Há uma postura humilde em reconhecer que ninguém é dono da verdade; a autenticidade de todo o processo está em buscar por ela. Por vezes, não a encontraremos, mas o caminho percorrido por si só já é revelador.
Não atrevo-me a dizer em nome de ninguém; não ouso fazer de minhas palavras as dominantes. Falo única e exclusivamente por mim mesma. Me responsabilizo apenas pelas palavras que escolho e pela forma como as digo.
Retornando ao fulcro da questão que, de fato, interessa, invoco a lei maior: escrevo porque quero e tenho vontade. Escrevo sobre o que quiser. Tomarei como guia o caráter que construo a quase 20 anos e os valores cultivados; deixarei os ideais inspirarem e alimentarem as vontades do ser. Que seja esplêndido sua existência só pelo fato de existir.
Escrevo porque esta é a forma de libertação que conheci. Talvez exercer plenos poderes sobre a escolha de palavras seja uma sensação de controle que aprecio. Já que, pelas palavras que uso, escolho as armas para lutar em cada batalha.
Não esperem a concretude dos aplausos e da glória para buscar pelo esplendor. Por vezes, carregar consigo a paz de espírito e a calmaria da mente é a maior consagração de vitória e de sucesso que alguém pode conhecer.
Por essa razão, posso afirmar que escreveria este texto novamente, com as mesmas palavras, nas duas circunstâncias extremas: sem ninguém para lê-lo ou com uma plateia esperando por ele.
Tendo argumentado e firmado certas posições, encontro-me em um estado que há tempos não estava mais acostumada: alívio. Mesmo com um adversário desconhecido, coloquei minhas cartas em jogo com convicção e estratégia para buscar a vitória.
Caso a metáfora não tenha se esclarecido por conta própria, fica sua versão explícita também ao caro leitor: a vitória nada mais seria do que a liberdade de ser.
Apesar do jogador adversário ainda permanecer no anonimato – seja pelo tempo ou pelas circunstâncias – algo me diz (e fica a critério do leitor chamar este evento de acaso ou pressentimento) que este jogo está a meu favor.
***
Acostume-se, os textos neste blog serão extensos. Entretanto, creio que se chegou até o final deste primeiro, talvez se interesse pelo o que vem por aí. Agradeço pela leitura! Até breve.
Autenticamente,
Julia.